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A empresária goiana Nathália Secco, 34 anos, que é a CEO da Orchestra Innovation Center e fundadora da Orchestra Ventures, em Rio Verde (GO), conquistou um título inédito para o Brasil.
Ela saiu vencedora na premiação do prestigiado Summit Global Women in Agritech (GWIA), realizado no final de setembro na cidade de Antoing, na Bélgica, a cerca de 91 km da capital Bruxelas. E contou com figuras ilustres, como o príncipe Édouard de Ligne-La Trémoïlle e sua esposa, a princesa Isabella Orsini de Ligne-La Trémoïlle.
Realizado desde 2019, o GWIA é um evento internacional para mulheres líderes no setor de tecnologia agrícola, que valoriza a inovação, a sustentabilidade e o networking. A cúpula que nasceu no Canadá, com edições em Montreal, neste ano fez sua estreia no país europeu.
“Desde o início da cúpula fui convidada pessoalmente para participar pela própria presidente da organização. Já a conheço há anos e desde então venho acompanhando o GWIA”, diz Nathália.
Ela se refere à microbiologista Sâadia Lakehal, fundadora e CEO da canadense Emperia Industries Connect. Além de criar parcerias, acelerar a inovação e promover um sistema alimentar global mais sustentável e resiliente, capacitando mulheres em papéis-chave, a cada edição o GWI faz o reconhecimento do trabalho de mulheres ao redor do mundo.
Nathália conta também que foi convidada para participar de um dos painéis e falar sobre a agritech do ponto de vista do Brasil. “Fiquei muito feliz de poder representar o Brasil”, diz ela.
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Nathália Secco, durante sua apresentação num dos painéis do Global Women in Agritech
Da música para o financiamento em tecnologia e inovação agro
Não é à toa este reconhecimento. Cantora lírica crossover formada em Música pela Universidade Federal de Goiás, ela elevou sua carreira para além dos palcos. Quando fundou a Orchestra Innovation Center em 2019, ela foi a primeira aceleradora do agro de Goiás voltada ao impulsionamento da inovação tecnológica.
“Ajudávamos as startups internacionais a se desenvolverem na região. Na época, eram startups britânicas e canadenses que vieram para o Brasil”.
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Nathália Secco na sede da Orchestra, em Rio Verde (GO).
Três anos depois, em 2022, Nathália fundou a Orchestra Ventures, passando a investir em agtechs no país a partir de um fundo de R$ 6 milhões aportados por ela, mais quatro empresas e três produtores rurais da região.
Além de olhar para fora, Nathália também investiu nela mesma. De lá para cá, se aprofundou no conhecimento sobre os seus negócios: formou-se como Venture Capital Executive pela Universidade UC Berkeley e ainda acumula um MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Mas a empreendedora de hoje já estava a caminho antes de se tornar CEO, ao liderar projetos na área de inovação no agronegócio na empresa dos pais, a Fertiverde, revenda agrícola do sudoeste goiano. Por seus feitos, foi indicada pela Forbes como uma das 20 mulheres mais inovadoras em Agtech, além de receber destaque da Forbes Under 30 em 2020.
Goiana faz a bandeira brasileira surgir na conferência internacional
“Achei que ia ganhar porque tinha a bandeira do Brasil no palco, bem na hora da premiação. Como fui a única brasileira entre as finalistas e então essa era minha crença.”
O GWIA distribuiu prêmios e reconhecimentos em dez categorias de liderança em áreas diversas como foodtech, orgânicos, cosméticos biológicos, produtos farmacêuticos do agro e agtech.
“Minha categoria era agtech e concorri com outras 22 mulheres”, diz ela, que apareceu na tela das finalistas junto com uma norte-americana e uma canadense. “Foi um grande orgulho estar entre elas. A americana, por exemplo, tinha lá seus 50 anos de idade, então com mais história do que eu.”
Para ela, a participação foi uma oportunidade de representar o Brasil e refutar a imagem negativa do produtor nacional, mostrando que a sustentabilidade já é uma realidade no campo. Em sua fala internacional, fez essa defesa com um viés pragmático.
“Eu falei: olha, o Brasil cresce e é sustentável. O produtor brasileiro quer ser sustentável, só que também tem de ser viável para ele. […] Para que tenhamos mais implementação de sustentabilidade, as empresas precisam dar mais incentivo para isso.”
A executiva lembrou que o produtor brasileiro já busca ativamente soluções como o uso de biológicos e o cuidado com o solo. Para ela, isso se contrasta com a falta de incentivos financeiros e o histórico de países desenvolvidos que nem estão se esforçando em recuperar suas áreas desmatadas (e que hoje criticam o Brasil). “Eles ignoram a realidade de que a sustentabilidade precisa caminhar lado a lado com a viabilidade econômica”, afirma.
Biotecnologia em larga escala: ganhos na soja e milho
O sucesso da Orchestra é a prova de que a tecnologia é a chave para conciliar o binômio economia-sustentabilidade. O prêmio veio justamente pela sua atuação na aplicação de tecnologias sustentáveis em grandes áreas. Os projetos a agtech já impactaram cerca de 200.000 hectares nas culturas de soja, milho, cana e algodão na região do sudoeste goiano.
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Apresentação de resultados de startups sob os cuidados da Orchestra numa lavoura de soja
Entre os destaques, Nathália pontua que suas duas empresas ajudaram a fomentar o uso de biotecnologias para a nutrição das plantas. Isso levou a um ganho de produtividade da ordem de 3 a 8 sacas de 60 quilos por hectare.
“Houve também uma redução média de cerca de 40% no custo da aplicação de herbicidas por causa do uso de sistemas de pulverização em taxa variável e bioinsumos”, afirma Nathália. Além disso, as startups sob o guarda-chuva da Orchestra cresceram, em média, três vezes o faturamento em apenas seis meses.
Crítica e transição: em busca do capital americano
A presença da goiana em um painel sobre o futuro da agtech sublinhou o avanço da inovação brasileira, ao mesmo tempo em que expõe um problema crônico: a carência de capital de risco no agro. Apesar dos casos de sucesso, ela faz uma crítica contundente à mentalidade do setor corporativo brasileiro. O país investe “muito menos” em startups do agro, na comparação com mercados mais maduros, como o Vale do Silício.
“Ainda é muito difícil de entender essa mentalidade do investimento em novas tecnologias, de desenvolver em conjunto e não sozinhos,” diz.
Em uma decisão estratégica, há cerca de dois anos, a Orchestra Ventures está migrando parte de seu modelo de negócios para Orlando, nos EUA, como parte da tentativa de iniciar um ecossistema de investimentos mais aquecido e diversificado por aqui.
Ela está abrindo um fundo misto que mira especialmente o mercado imobiliário na Flórida. O movimento visa atrair o capital brasileiro para investir nos EUA e, ao mesmo tempo, continuar a atuar no venture capital em agrifoodtechs.