SMADS ignora o caráter público da assistência social e tenta reduzir direitos à caridade
No último dia 22 de setembro, a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) publicou a Portaria nº 105/2025. À primeira vista, o texto parece inofensivo e virtuoso: regulamenta doações, acordos de cooperação e voluntariado. Mas, ao olhar com atenção, percebemos um grave retrocesso na política de assistência social da cidade de São Paulo.
A portaria confunde o verdadeiro papel do voluntariado com o dever constitucional do Estado de garantir proteção social. O voluntário tem, sim, um espaço importante na sociedade civil, mas não pode ser usado para adentrar os serviços públicos de proteção social e atuar junto as equipes profissionais do SUAS. Isso compromete a qualidade do atendimento, fragiliza a continuidade dos serviços e ameaça os direitos da população.
O Conselho Municipal de Assistência Social (COMAS-SP) sequer foi consultado, em flagrante violação ao controle social da política. Silenciar o COMAS é calar a voz da sociedade civil organizada e enfraquecer a participação popular — justamente o oposto do que a Portaria afirma buscar ao se dizer inspirada na participação da sociedade civil.
Mais grave ainda é o risco de precarização dos serviços socioassistenciais. A portaria abre brecha para que pessoas físicas, jurídicas e até instituições religiosas prestem atendimento direto, desconsiderando os princípios de laicidade e universalidade que devem orientar uma política pública de Estado. Não é aceitável que o cuidado com a população em situação de desproteção social dependa da “boa vontade” de voluntários, sujeitando usuários a práticas discriminatórias, moralizantes, de caráter assistencialista, além de comprometer o vínculo relacional entre o cidadão e profissional do SUAS.
Trata-se de um retrocesso ético: a tentativa de transformar direitos em favores, cidadania em ajuda, Estado em caridade. Esse movimento recoloca a assistência social nos moldes do passado, quando predominava a filantropia e o clientelismo, em vez da responsabilidade pública e da garantia de direitos.
Em vez de fortalecer o SUAS com concursos, equipes qualificadas e recursos adequados, a Prefeitura aposta na desprofissionalização e na substituição de trabalhadores por mão de obra gratuita. Isso não é inovação, é desmonte.
Por isso, defendo a imediata revogação da Portaria nº 105/2025. A assistência social é direito, não caridade. O SUAS foi conquistado com décadas de luta e resistência e não pode ser desmontado por decretos que atendem à lógica neoliberal e enfraquecem a presença do Estado.
São Paulo precisa avançar na proteção social, não retroceder ao tempo da caridade governamental.
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